Duas decisões recentes do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (TRT/SC) reforçam a responsabilidade dos empregadores na prevenção e no combate à discriminação racial no ambiente laboral.
Vítima suspensa
Em maio, uma decisão da 3ª Turma do TRT/SC condenou uma empresa a indenizar um trabalhador que, além de ofendido por racismo, foi suspenso após comunicar a conduta dos colegas para a superior.
O caso teve início em Joinville, norte do estado. Durante um dia normal de trabalho, um médico veterinário utilizava o computador compartilhado da empresa quando se deparou com mensagens de teor racista – questionando sua competência devido à raça e origem regional – trocadas entre dois colegas via WhatsApp. Um dos envolvidos na conversa havia usado a máquina anteriormente e esquecido de encerrar a sessão.
Diante da gravidade do ocorrido, o veterinário acionou a superior hierárquica para verificar o conteúdo, além de registrar um boletim de ocorrência no mesmo dia, acusando os colegas de racismo.
Ciente dos fatos, o empregador iniciou um processo administrativo interno. O procedimento resultou em três penalidades: um dos envolvidos na conversa foi demitido sem justa causa, o outro recebeu uma advertência, e o veterinário ofendido foi suspenso por oito dias, com respectivo desconto no salário, com base em uma suposta invasão de privacidade.
Insatisfeito com a penalidade aplicada, o profissional procurou a Justiça do Trabalho, alegando que a sanção era injusta e desproporcional, especialmente considerando que havia sido vítima de racismo.
No julgamento de primeiro grau, o juiz responsável pelo caso na 2ª Vara do Trabalho de Joinville considerou desproporcional a suspensão do reclamante, anulando a penalidade e ordenando a devolução dos valores descontados no salário.
A sentença também reconheceu o dano moral sofrido devido ao racismo, condenando a reclamada a pagar R$ 5 mil por danos morais decorrentes da suspensão e R$ 15 mil pelas ofensas raciais.
Recurso da reclamada
Ao recorrer à segunda instância para tentar reverter a condenação, a clínica argumentou que agiu dentro dos limites de seu poder disciplinar. Contudo, o relator do caso na 3ª Turma, desembargador José Ernesto Manzi, não entendeu desta forma.
O magistrado manteve a decisão de anular a suspensão e destacou o dever do empregador de indenizar o trabalhador ofendido. No entanto, o acórdão reduziu a indenização por danos morais de R$ 15 mil para R$ 10 mil, considerando as medidas corretivas adotadas, como a demissão de um dos envolvidos. O voto do relator também retirou a indenização de R$ 5 mil pelos danos da suspensão.
A decisão está em prazo de recurso.
Apelido ofensivo
Outra decisão, também condenando o reclamado a indenizar o autor em R$ 10 mil, foi proferida em março pela 2ª Turma do TRT/SC. O caso envolveu um rapaz que recebeu o apelido ofensivo de “neguinho saci”, atribuído por uma das colegas.
O caso aconteceu em Itapema, litoral norte do estado. Ao procurar a Justiça do Trabalho, o reclamante afirmou que informou repetidamente aos supervisores sobre as ofensas raciais, mas nenhuma medida efetiva teria sido tomada.
O trabalhador recorreu então ao conselho de ética da instituição, mas as ofensas persistiram. Somente após ele utilizar um canal de denúncias, a agressora foi suspensa por três dias. No entanto, ao retornar, continuou com o comportamento discriminatório, fazendo piadas racistas no transporte fornecido pela empresa. Uma testemunha afirmou que essas atitudes permaneceram até o fim do contrato de trabalho da funcionária.
No primeiro grau, o pedido de indenização foi negado. Como fundamento, o juízo da Vara do Trabalho de Itapema alegou que o autor apresentou provas insuficientes para a caracterização do dano moral.
Recurso do autor
Inconformado com o desfecho do caso, o homem recorreu para o segundo grau do TRT/SC. Na 2ª Turma, a desembargadora Teresa Cotosky, relatora do caso, votou para reverter a decisão.
No acórdão, a magistrada enfatizou a gravidade da conduta da agressora e a omissão do empregador em tomar medidas efetivas. “Ouvir ofensas do tipo 'neguinho saci’ em seu ambiente de trabalho ou no transporte mantido pelo seu empregador uma única vez já teria o condão de minar a autoestima e dignidade de qualquer pessoa, quem dirá recorrentemente e mesmo após o ofendido ter se insurgido e denunciado a conduta a seu empregador, que, apesar de ter intervindo após ser provocada, não adotou medidas pedagógicas e disciplinares capazes de evitar a reiteração das ofensas”, destaca.
Teresa Cotosky concluiu a decisão enfatizando que as responsabilidades do empregador incluem não apenas garantir a segurança física dos trabalhadores, mas também assegurar um ambiente de trabalho em que a dignidade e os direitos fundamentais dos empregados sejam respeitados.
A empresa não recorreu da decisão.
Fonte: TRT12
Imagem: Canva